Investir no Brasil nunca foi para os fracos. Mesmo diante de uma economia em recuperação, as decisões recentes do governo Lula mostram que os desafios estruturais do país permanecem. O cenário econômico atual, descrito pelo relatório “A Encruzilhada: Investindo no Brasil”, publicado pela UBS, oferece um panorama detalhado e esclarecedor sobre os próximos passos que o Brasil deve tomar para garantir sustentabilidade econômica e atratividade para investidores.
O retorno ao crescimento
Nos dois primeiros anos do governo Lula, o Brasil experimentou um crescimento econômico robusto, impulsionado por uma política de aumento dos gastos públicos. Esse aumento aqueceu o consumo, contribuiu para a redução do desemprego e trouxe inflação para níveis dentro da meta. Em 2024, o Produto Interno Bruto (PIB) deve crescer cerca de 3%, um feito notável considerando os desafios internos e externos.
Entretanto, há sinais claros de que essa trajetória não é sustentável. Como aponta o relatório da UBS, os mercados estão precificando uma deterioração na confiança, o que se reflete na performance dos ativos financeiros. Essa tensão é um reflexo direto de uma dívida pública crescente e de incertezas em torno do arcabouço fiscal.
Caminhos possíveis
Identificamos três cenários possíveis para a economia brasileira, cada um com implicações distintas para investidores e para o desenvolvimento econômico do país:
- Austeridade fiscal
Inspirado pelo recente aumento da classificação de risco do Brasil pela Moody’s, este caminho priorizaria cortes significativos nos gastos públicos. O objetivo seria estabilizar a relação dívida/PIB e recuperar o grau de investimento, perdido em 2015. Esse movimento poderia desencadear uma onda positiva de investimentos estrangeiros, valorização do real e redução dos juros a longo prazo, mas enfrentaria resistência política e social considerável.
- Laissez-faire
A manutenção do atual ritmo de gastos, sem ajustes significativos, apostando em um crescimento da receita para equilibrar as contas. Embora possa oferecer ganhos de curto prazo, esse caminho arrisca desencadear uma crise de confiança semelhante à que levou à recessão de 2015-2016. Para investidores, isso representaria um aumento da volatilidade e maior aversão ao risco.
- Ajuste moderado
Um meio-termo, combinando cortes moderados de gastos com algumas medidas para aumentar a arrecadação. Esse cenário, considerado o mais provável, garantiria um equilíbrio mínimo para cumprir a âncora fiscal, embora sem eliminar completamente os riscos de longo prazo. Para os mercados, isso significa juros altos por mais tempo e inflação pressionada.
Decisões que definem investimentos
A incerteza fiscal impacta diretamente os ativos financeiros, e a UBS apresenta uma análise detalhada da atratividade de diferentes classes de ativos no atual cenário brasileiro:
- Títulos indexados à inflação e pós-fixados são considerados Atraentes, pois oferecem proteção contra a inflação e um colchão em períodos de incerteza.
- Títulos prefixados, devido à alta volatilidade e aversão ao risco, permanecem como Não Atraentes.
- Ações e fundos imobiliários estão Neutros, em grande parte devido à preferência dos investidores locais por renda fixa e ao cenário de incerteza.
- Ativos internacionais também são vistos como Neutros, já que a dinâmica global permanece desafiadora, mas com oportunidades em renda fixa de qualidade.
A diversificação é essencial para enfrentar esse momento crítico. O mercado local pode ser volátil, mas estratégias que combinam proteção contra inflação e exposição internacional oferecem um equilíbrio interessante para investidores.
O papel do governo Lula
A recente notícia da preparação de um pacote de corte de gastos mostra que o governo reconhece os desafios à frente. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, indicou que o anúncio dependerá de negociações políticas. Essa dinâmica política reflete um dilema recorrente no Brasil: equilibrar austeridade e crescimento sem desestabilizar uma sociedade polarizada.
Se, por um lado, o governo acena para a responsabilidade fiscal, por outro, enfrenta a pressão de manter políticas sociais robustas. Esse equilíbrio será crucial para determinar o rumo da economia e a percepção dos investidores.
Reflexos no mercado e estratégias de investimento
Os mercados aguardam clareza sobre as decisões do governo. Enquanto isso, a UBS recomenda prudência e diversificação. Para os investidores, a chave será monitorar os desdobramentos fiscais e manter uma postura defensiva, com foco em ativos mais resilientes.
Além disso, o ambiente externo pode oferecer oportunidades interessantes. Nos Estados Unidos, o ciclo de cortes de taxas pelo Fed e o fortalecimento do crescimento econômico criam um cenário favorável para alocação em renda fixa e ações ligadas a inovações, como a inteligência artificial. Já na China, medidas de estímulo podem impulsionar o mercado de commodities, favorecendo empresas brasileiras exportadoras.
Conclusão: a escolha que define o futuro
O Brasil está em um momento crítico. As escolhas do governo Lula nos próximos meses determinarão não apenas o rumo da economia, mas também a percepção do país como destino de investimentos. Para empresas e investidores, entender esse contexto e adaptar suas estratégias será essencial para navegar por esse momento desafiador.
Enquanto aguardamos o desenrolar dos acontecimentos, uma coisa é clara: o Brasil segue sendo um país de oportunidades — mas também de riscos. E na encruzilhada atual, cada decisão conta.
Referência:
A Encruzilhada: Investindo no Brasil. UBS, outubro de 2024.